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Friday, September 23, 2016

Época de 2016/2017 – crise ou no crise? – Parte 3 de 3

Quem leu a segunda parte deste artigo pode estranhar e até questionar o porquê dos dados serem relacionados com o futebol e focado especialmente num grande evento. A explicação é simples. Não existem praticamente estudos sobre o basquetebol. E os estudos publicados em Portugal são quase todos ligados ao futebol e aos festivais de música e poucos sobre outras modalidades. Mas existe ainda uma outra razão mais de fundo. O basquetebol era comparado com o futebol como modalidade modelo na gestão desportiva (criação dos cursos de treinadores e sua certificação, centros de alto rendimento, liga profissional, etc.). Mas só que o desporto evoluiu para um espetáculo desportivo, inserido na indústria desportiva e outras áreas passaram a ter tanto ou mais peso que a gestão desportiva, nomeadamente a gestão do marketing e comunicação e foco no consumidor do espetáculo desportivo. E isso na indústria desportiva fez e faz toda a diferença. Hoje, ao compararmos o trajeto das duas modalidades achamos que o comparativo é despropositado. Pois é. Desafio o leitor a fazer esse exercício de raciocínio e encontrar as razões para a diferença que hoje existe entre estas duas modalidades.
Voltando ao basquetebol e à crise: então, que tipo de crise é que o basquetebol enfrenta?

Eu diria que o basquetebol português falha onde não podia falhar. Pela falta de uma visão clara sobre o que o adepto, fan, simpatizante quer ver, do que quer desfrutar enquanto espectador e que permita ao basquetebol português ser uma modalidade que acrescente valor (prazer, emoção, interação, memórias positivas), isto do lado do adepto, fan simpatizante. Pelo lado das marcas, estas querem acima de tudo visibilidade e retorno do capital investido e, por isso, só quando existe uma competição interessante, disputada por diversos clubes, equilibrada, com adeptos, fans simpatizantes nos pavilhões, é que a modalidade consegue chamar a atenção dos órgãos de comunicação social, devendo estar igualmente fortemente presente nas redes sociais como forma de poder interagir com os adeptos/fans, marcas e todos os outros stakeholders.
É importante demonstrar que a modalidade pode ter impacto e que pode ser visível aos olhares de quem precisa e quer investir aproveitando o basquetebol como forma de promover a sua marca ou um determinado produto.

É imperioso que seja feito ao basquetebol português um rebranding. A modalidade precisa de uma mudança, que deixe de ser uma modalidade pouco capaz de dar prazer ao adepto, fan, simpatizante, e retorno aos patrocinadores, para uma modalidade de cara lavada, capaz de encher os olhos de brilho e de satisfação aos adeptos, fans simpatizantes, patrocinadores, tornando-se assim na nova tendência do desporto português ao assumir um nova identidade e posicionamento no espetáculo desportivo, isto é distinguirmo-nos das outras modalidades o máximo possível. Para isso, há que recriar a marca basquetebol e os seus subprodutos (competição sénior masculina e sénior feminina, formação, pontos altos) com uma identidade própria e uma comunicação eficaz, capaz de se diferenciar das outras modalidades no que diz respeito àquilo que oferece como espetáculo desportivo ao adepto, fan ou simpatizante e patrocinadores. Há que encontrar um eixo de comunicação de sucesso e uma política de comunicação integrada que dê suporte ao trabalho a ser desenvolvido. É claro que é preciso redefinir outras áreas que envolvem a modalidade e a organização de cada jogo/evento em si. Não podemos ter uma atitude passiva ao pensarmos que as marcas nos vão dar algo quando o basquetebol não tem nada para oferecer. Acerca desta clara necessidade, Vicente Moura, ex-presidente do Comité Olímpico de Portugal, fazendo o balanço sobre a participação portuguesa nos jogos olímpicos numa entrevista a um jornal português, referia que não há espetáculo para além do futebol. Esta é a perceção de alguém do desporto que aponta claramente na necessidade de se encontrar novos caminhos.

Será que haverá alguém que ainda pense que haverá uma marca que dê dinheiro para o basquetebol sem hipótese de obter qualquer espécie de retorno? Que dê dinheiro para que passe uns jogos na televisão? As marcas querem associar-se a modalidades ou eventos desportivos que lhes tragam reconhecimento por parte dos adeptos, dos fans, simpatizantes, que lhes traga visibilidade, prestígio e vendas. Vendas acima de tudo. A visão do marketing desportivo que via o investimento como uma valorização da marca acabou. O marketing desportivo tem de acrescentar vendas, e isso só é possível quando acrescentarmos valor como modalidade ao patrocínio. Temos de envolver clubes, adeptos, fans, planos de comunicação, meios de comunicação social, uso das redes sociais, e montes, montes de adeptos e fans, muitos fans que tenham uma paixão infinita pelos seus clubes e pela modalidade, e que ao saírem de um pavilhão sintam o desejo de voltar, tornando-se embaixadores da modalidade, é isso que faz com que os recintos desportivos se venham a encher de pessoas. Um evento de qualidade precisa de adeptos/fans nos pavilhões, de audiências da televisão e de seguidores nas redes sociais. Se as marcas quiserem ter minutos na televisão encomendam uma campanha de comunicação a uma agência de comunicação ou de meios, e se for bem-feita e bem-sucedida têm milhões de visualizações e milhões de menções nas redes sociais.

A NBA, considerado o modelo de referência do marketing desportivo ao nível da indústria desportiva, é um bom exemplo da importância e relevo que dá ao consumidor (adepto/fan). Depois de momentos conturbados nos anos 70, veio a tornar-se a liga de referência ao nível mundial. Implementou um modelo de negócio que no inicio foi baseado na rivalidade entre equipas Lakers vs Celtics, de cidades Los Angeles vs Boston e de jogadores Magic Johnson vs Larry Bird. Com o apoio do marketing da liga, dos donos das equipas, da associação de jogadores, e televisão, construiu uma competição capaz de agradar a diversos públicos, de proporcionar experiências únicas através das suas instalações desportivas, qualidade do jogo, competitividade da competição, interação com o público através das redes sociais, relações com as comunidades através do marketing de causas ou ações de responsabilidade social, sendo assim capaz de manter o desejo de os adeptos/fans voltarem a ver um jogo de basquetebol e seguirem a sua equipa apesar de os preços serem elevados.

Não será então que está na altura de a Federação Portuguesa de Basquetebol (FPB) fazer uma análise e tirar as ilações daí advindas sobre se tem ou não uma estrutura humana aos diversos níveis da gestão das competições e que são fundamentais para que o basquetebol saia deste momento menos bom em que se encontra?

Não basta mudar quadros competitivos, isso é um assunto menor. No caso das competições seniores masculinas e femininas do primeiro nível de competição, na minha opinião, o que é necessário é criar uma equipa de trabalho que faça a gestão da área desportiva, de marketing e comunicação, em sintonia com a direção da FPB, de uma forma competente, profissional e com paixão, porque a crise existe, sim é verdade, mas existe acima de tudo porque não temos tido a abordagem correta vinda dos problemas que a transformação que houve no desporto colocou ao basquetebol.

A minha paixão pelo basquetebol é cada vez maior e mais forte, fruto das experiências desenvolvidas quer em Portugal quer no estrangeiro e quer o meu coração quer a minha cabeça estão de alma e coração com a nossa modalidade.

O futuro vai chegar


António Pereira

Wednesday, September 21, 2016

Época de 2016/2017 – crise ou no crise? – Parte 2 de 3


Parecendo que mudo de assunto, mas não é tanto assim, foi com enorme curiosidade que assisti à campanha da seleção portuguesa no Europeu de futebol, na tentativa de a observar do ponto de vista desportivo, mas, acima de tudo, numa perspetiva da gestão da comunicação e do marketing.

Também não deixei de estar atento ao que a UEFA e a FIFA fizeram no campeonato europeu nas áreas da comunicação e do marketing. Apetece-me, pois, dar os parabéns às duas organizações, bem como à Federação Portuguesa de Futebol (FPF).

Passada a euforia pela conquista do Euro 2016, refleti e cheguei à conclusão que realmente o problema do basquetebol português está mesmo na crise. Só que a crise que identifico não é a mesma que alguns dão como argumento para o que não se faz ou para o que está mal na nossa modalidade. A crise existe? Sim! E já existe há muitos anos? Sim! E é bem profunda? Sim! E é só financeira? Não! Antes pelo contrário, tem muito mais a ver com outras áreas do que com a financeira.

Até porque, apesar de tudo, os sinais da crise são mais evidentes em algumas modalidades ou organizações do que noutras.

O basquetebol ao nível internacional está de ótima saúde. E nunca o desporto em geral suscitou tanto interesse nas pessoas, sejam elas adeptas, fans ou simplesmente simpatizantes. O espetáculo desportivo é um sucesso em diversas modalidades, nos quatros cantos do mundo, e em diferentes patamares de competição.

E também se pode dizer que nunca o investimento das marcas no desporto foi tão elevado, quase sempre acompanhado por campanhas de comunicação de grande qualidade, nas quais as marcas surgem associadas a determinada modalidade, apelando à paixão do adepto, ao sentimento de pertença e ao envolvimento/engajamento ou associação com o consumidor do espetáculo desportivo. Os meios utilizados são diversos, como é natural, sendo que a televisão continua a merecer a maior parte da atenção (investimento) das marcas nas suas campanhas de comunicação. No entanto, o marketing digital e as redes sociais começam a ter cada vez mais impacto para alcançar os objetivos propostos.

É isso mesmo que a divulgação de diversos estudos desenvolvidos por instituições académicas, de organizações privadas, de empresas que se dedicam ao estudo de mercados ou mesmo das redes sociais nos dão a conhecer dados. Entre estes estudos, surgiu o do impacto financeiro que, de acordo com um estudo do IPAM, o Campeonato da Europa 2016 podia gerar 609 milhões dos quais 213 milhões se referiam apenas à presença e vitória nas meias-finais e na final, e 330 milhões seria o impacto total na economia nacional no percurso da seleção após a fase de grupos. Ao número de seguidores dos eventos desportivos, no que diz respeito ao número de pessoas que seguiram uma determinada transmissão na televisão, 3,7 milhões assistiram à final do Euro 2016. Já a Cision avança que o retorno mediático dos patrocinadores da Seleção Nacional podia vir a atingir os 117 milhões de euros. Um dado interessante é o que diz respeito ao interesse declarado na Seleção Nacional, que subiu para 85 %, aumentando a cobertura das marcas patrocinadoras para 5,6 milhões de pessoas. Já são poucos os portugueses que ficam de fora. A presença de Éder, autor do golo da vitória da seleção, num programa de televisão foi visto por 972 mil pessoas, de acordo com um estudo da Marktest. Nessa entrevista, o jogador vestia uma camisola de um patrocinador oficial da Seleção Nacional. Dos 31 minutos e 46 segundos de duração da referida entrevista, a marca do patrocinador esteve visível durante 7 minutos e 55 segundos, a que corresponde a 25 % da duração da entrevista, conseguindo atingir 930.700 pessoas. Se a marca tivesse recorrido a publicidade tradicional para obter a mesma exposição, teria tido o custo de investimento no montante de 617.556 euros a preço de tabela.

Em apenas dois dias, foram escritas mais de 60 mil notícias sobre a vitória da Seleção portuguesa no Euro 2016, sendo que foi igualmente um dos temas mais falados por todo o mundo. A Cision vai mais longe e indica que desde que Fernando Santos divulgou a lista de convocados e até ao final do campeonato Europeu 2016, a equipa nacional somou um total de 213.860 notícias e durante o período competitivo 40 % da atenção mediática dedicada a Portugal pela comunicação internacional estava relacionada com o Euro 2016 num total de 532.655 notícias.

Outros dados que estão disponíveis dizem respeito aos valores que as marcas esperavam ter de retorno, sendo que esse valor era de cerca de 117 milhões de euros, caso Portugal conquistasse o Euro 2016.

Quantos às redes sociais os dados divulgados pelo Facebook apontam que o Euro 2016 gerou 950 milhões de interações na sua rede, 146 milhões só na final.

A página da Seleção Nacional no Facebook registou um aumento de 46 % (747 mil novos fans), 375,6 milhões de utilizadores que fizeram 196,6 milhões de gostos e mais de 500 mil comentários. No Twitter, o número aumentou 25,28% e no Instagram houve um acréscimo de 273,288 seguidores. E quanto às marcas, o anúncio The switch teve mais de 50 milhões de visualizações e Paul Pogba: First never follows obteve 300.000 no You Tube.

Mas não se pense que é só o futebol que tem impacto ou retorno. Ainda recentemente o secretário regional do turismo e transportes referiu que o surf tem o retorno direto das competições realizadas nos Açores no montante de 1.6 milhões de euros, e isto a propósito de um evento onde uma marca que já patrocinou o basquete está presente.


Os dados são claros e deixam-nos… . Quanto à pequenez que o basquetebol português se tornou quando comparado com o futebol e não só. E relembro que o basquetebol era uma modalidade líder em várias áreas, tais como formação de treinadores, centros de alto rendimento e profissionalização da modalidade, mas que se deixou afundar num lamaçal que suga a modalidade para uma série de problemas que nos deixam apreensivos quanto ao seu futuro. 

Monday, September 19, 2016

Época de 2016/2017 – crise ou no crise? – Parte 1


1ª Parte de 3

O 1 de setembro de 2016 é, por norma, o dia em que as equipas seniores portuguesas começam a treinar.

Esta época, contudo, apresentam-se duas exceções. O campeão em título, o FC Porto, e o finalista da última edição do campeonato, o Benfica, já regressaram ao trabalho há umas semanas. E tiveram mesmo de o fazer porque receberam um convite da FIBA Europa para participar na nova Basketball Champions League, uma competição polvilhada por polémicas, geradas logo na sua fase de gestação.

A participação nesta prova motivou que ambos os clubes tivessem de começar a época mais cedo, com objetivos claros, para que se possam apresentar no melhor nível para atacar a pré-eliminatória que as qualificam para fase de grupos da competição.

Esta competição desenhada com uma determinada estrutura acabou por será alterada já durante o mês de agosto após três clubes terem solicitado a sua inscrição na prova. A FIBA aceitou a inscrição destes clubes com base na qualidade da competição doméstica onde cada clube compete, histórico da participação das equipas nas competições europeias no passado recente. Ficaram as equipas portuguesas então dependentes do playoff de acesso que por vias desta alteração foi reduzido de duas eliminatórias a uma eliminatória. Portanto não estamos, temos de nos apurar. Do mal ao menos.


As restantes equipas, normalmente, começam a treinar a partir de 1 de setembro. Algumas, poucas, iniciam os treinos semanas mais tarde. O critério normalmente subjacente a esta decisão tem mais a ver com os aspetos financeiros do que desportivos. Já foi tempo em que as questões desportivas condicionavam o arranque da época. Também se deve acrescentar que muitas das equipas raramente começam a treinar com o plantel completo.

Uma das razões para essa situação é a necessária poupança dos meios financeiros à disposição. Dizem: é a crise! É um dos argumentos mais proferidos. Há quem acrescente a palavra económica, ficando assim a crise a ser económica. Há também quem vá mais longe e diga que não há dinheiro, não há patrocinadores, não temos jogos na televisão, como é que nos havemos de arranjar? Somos uma modalidade invisível. Haverá, ainda, outros argumentos considerados como válidos, mas posso dizer com segurança que estes são os mais usados.