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Thursday, March 28, 2019

Conteúdo e qualidade numa modalidade desportiva - Que relação?

2ª Parte
A ausência de público nas bancadas será pela falta da qualidade das decisões ou pela ausência de um conteúdo com qualidade?
Foi com esta pergunta que terminámos a primeira parte deste artigo. Uma questão que surge na sequência da repetição de imagens de poucos espectadores nos pavilhões, de informação com lacunas e erros grosseiros no site da Federação Portuguesa de Basquetebol (FPB), de jornais que falam muito do basquetebol americano e raramente do basquetebol português. Face a isto, colocam-se novas dúvidas…
- Será que o basquetebol português não tem dirigentes e treinadores capazes de encontrar soluções que façam despertar o interesse do público (adeptos e fans) para assistirem a um evento/jogo de basquetebol?
Qual o impacto dos jogadores que disputam a competição? Têm ou não qualidade? São capazes de contribuir para atrair público (adeptos e fans)?

Quando era jovem existia uma frase que dizia “sem palhaços, não há circo”. Sem bons praticantes não há jogo capaz de despertar o interesse do público (adeptos e fans). 

Precisamos de basquetebolistas de qualidade e que se tornem referências da competição e isso contribuirá não só atrair público (adeptos e fans) mas também praticantes que se inspiram nesses modelos. É fundamental!

Outros fatores ou indicadores podem contribuir para o sucesso de uma modalidade. O número de praticantes e o seu crescimento sustentado são um sinal claro da popularidade da modalidade.
O nível da arbitragem também ajuda a construir a imagem da competição. Se a forma como os juízes julgam as ações dentro do campo forem consideradas isentas, rigorosas e justas, estes dão um contributo para uma imagem positiva da competição.
A qualidade da instalação desportiva é igualmente importante. O conforto, linhas de marcação bem definidas (se possível apenas de basquetebol), marcador, boa luminosidade e o acesso à internet é fundamental no engajamento do público (adeptos e fans) no espetáculo desportivo 4.0.
O contributo dos jornalistas e comentadores é fundamental desde que demonstrem conhecimento da modalidade, do jogo, dos praticantes, preferencialmente na vertente espetáculo (desde que não a transformem num circo), proporcionando um esclarecimento sóbrio aos leitores e ouvintes, permitindo aumentar as leituras e captar audiências das suas publicações, o que levará, igualmente, ao incremento do número de pessoas nos recintos desportivos.

Como conclusão, podemos dizer com segurança que para uma modalidade ter sucesso necessita de dirigentes com visão, que definam e apliquem eficazmente uma estratégia de gestão desportiva, gestão financeira, gestão do marketing e comunicação, no sentido de levar a organização desportiva a ganhar, a proporcionar espetáculo, a desenvolver uma relação com a comunidade em que está inserida e a criar, ao mesmo tempo, uma relação de compromisso entre a organização e os seus adeptos e fans e outros stakeholders.
A modalidade precisa igualmente de treinadores que liderem a sua equipa rumo ao êxito através da escolha de estratégias que lhes permitam ganhar jogos e competições, mas sem descurar o espetáculo desportivo e o entretenimento dos adeptos e fans.
O reconhecimento da qualidade das decisões dos dirigentes e treinadores é importante, daí muitos deles se tornarem protagonistas e ícones da organização desportiva, da competição ou da modalidade.


Contudo, a entrada numa instalação desportiva por parte do público tem como objetivo ver a bola a entrar no cesto, preferencialmente muitas vezes, em movimentos só ao alcance de autênticos deuses, e que o seu clube vença.
As pessoas querem ver o seu clube a ganhar, mas querem ver atletas de eleição, querem ver o Stephen Curry, Giannis ou LeBron James, no futebol o Ronaldo ou Messi, tal como no passado recente quiseram ver o Magic Johnson, Larry Bird e Michael Jordan e no futebol o Zidane e Figo e ainda antes o Wilt Chamberlain, Bill Russel, Bob Cousy ou Jerry West e as estrelas do futebol Eusébio ou Pelé.

Os atletas são os dínamos da afluência de público nas bancadas, do clubismo e do mediatismo de uma modalidade. É desta forma que o sucesso de uma modalidade tem de ser construído e medido.
Os adeptos não vão ao pavilhão para verem os dirigentes ou os treinadores, embora estes sejam fundamentais e decisivos. Aos primeiros, reconhece-se a capacidade de liderança e o mérito pela visão e gestão da organização desportiva. Aos segundos, identifica-se a competência a liderança do grupo e ambição no desempenho das suas funções. Mas são os jogadores, especialmente nesta era digital, que comunicam melhor com os adeptos e fans e capazes de se relacionarem com estes através das redes sociais e diversas plataformas digitais.
Um jogo sem público significa que o espetáculo oferecido aos adeptos e fans não tem qualidade, independentemente de a comunicação poder não ter funcionado da melhor forma.
Se, na atualidade, houvesse jogadores de referência, tais como já o foram Dale Dover, Jean Jaques, José Carlos Guimarães, Heshimu Evans, Carlos Lisboa e muitos outros (peço desculpa aos jogadores portugueses que não menciono aqui e que mereciam ser mencionados) haveria ou não mais pessoas a ver um jogo de basquetebol?
Reconheço que a FPB tem feito um esforço, contudo a ausência de uma visão partilhada entre os diversos agentes da modalidade leva a que o basquetebol não descole da situação em que se encontra há diversos anos.
Nem as transmissões televisivas, que se tornaram possíveis devido á entrada verbas proveniente do Placard, previstas no Regime Jurídico da Exploração e Prática das Apostas Desportivas, conseguem impulsionar o basquetebol português.
Não se pode perder mais tempo na aplicação de um business plan inovador e que demonstre um alinhamento de ideias consistentes e coerentes entre as diversas partes envolvidas na gestão da competição. Se tal não vier a acontecer, dificilmente o basquetebol voltará a ser uma modalidade de referência em Portugal na área da indústria desportiva e do espetáculo.
Fica uma última pergunta: a ausência de público nas bancadas será pela falta da qualidade das decisões ou pela ausência de um conteúdo de qualidade?

António Pereira

António Pereira, é licenciado em Comunicação Organizacional com as especialidades de Comunicação de Marketing e Comunicação de Relações Públicas, Mestre em Marketing e Comunicação e escreve sobre Gestão do Desporto, Marketing e Comunicação do Desporto no blog https://apbasketball.blogspot.com/


Sunday, March 24, 2019

Conteúdo e qualidade numa modalidade desportiva - que relação?

1.ª Parte

O sucesso de uma modalidade desportiva mede-se pela capacidade de:

1 – Atrair público à instalação desportiva, isto é, levar ao consumo do evento/jogo de basquetebol (ou outra modalidade) por parte de adeptos e fans e a capacidade de os tornar promotores da marca.

Este é o verdadeiro propósito de uma marca (organização que gere a competição), que tem um produto para vender (evento/jogo), que, neste caso, é de uma modalidade desportiva, o basquetebol.

As modalidades desportivas estão inseridas na designada indústria desportiva, a que eu gosto de juntar a palavra espetáculo, sendo que assim a expressão fica a ser indústria desportiva e do espetáculo.

2 – Atrair o interesse dos diferentes meios de comunicação social (jornais, rádios e televisão) para divulgar a informação do jogo/evento ou individualidades da modalidade desportiva junto dos seus leitores, ouvintes ou espectadores televisivos, devido ao sucesso que a modalidade evidencia, levando a pensar que o produto é capaz de gerar audiências e, como tal, permita justificar o espaço que lhe é dedicado.

3 - Apoio das marcas patrocinadoras como forma de promover os seus produtos, devido à exposição que a modalidade possui junto do público consumidor que lhes interessa (o target de cada marca), através de diferentes meios de comunicação.

4 - Um quadro competitivo interessante, dinâmico e onde o equilíbrio e a incerteza do resultado sejam uma constante de acordo com os princípios do marketing desportivo.
Assim, podemos afirmar sem hesitações que sem público (adeptos e fans) nas bancadas não é possível considerar uma modalidade desportiva como uma modalidade de sucesso.



Qual é então o problema do basquetebol para atrair público, adeptos e fans?

Tudo começa com uma análise e um diagnóstico correto e eficaz a que deverá corresponder um plano estratégico que envolva, especialmente, os dirigentes e os treinadores, unindo-os à volta de uma visão, submetendo-os a um alinhamento de procedimentos e uma finalidade na gestão das diversas áreas do basquetebol.

E estes dois agentes da modalidade porquê?

Porque são eles que estão no centro das decisões! Uns tomam as decisões referentes à área da gestão desportiva e os outros tomam decisões na área do jogo, nomeadamente na gestão do grupo de trabalho (equipa), tendo ambos grande impato no produto final que é o jogo de basquetebol.

É por isso que precisamos de dirigentes com uma visão clara daquilo que deve ser a competição/espetáculo de basquetebol e que compreendam nitidamente aquilo que o público (adeptos e fans) querem ver. E de treinadores que compreendam e escolham modelos de jogo que promovam aquilo que o basquetebol significa: espetáculo. Ou seja, modelos de jogo que permitam captar o interesse do público (adeptos e fans), comunicação social e patrocinadores, sem descurar aquilo que todos ambicionam que é a vitória.

O basquetebol sempre foi sinónimo de espetáculo e um bom exemplo são os Harlem Globetrotter. Quantas pessoas conhecem os nomes dos seus jogadores? Eu diria que muito poucos ou quase ninguém, mas isso não impede que o público se desloque ao pavilhão para ver um espetáculo de entretimento através do jogo de basquetebol, tendo-se tornado numa marca de referência.



Podíamos colocar a mesma questão noutras áreas.

Qual a razão das pessoas verem um filme, uma série de televisão, um documentário ou um debate?

A resposta é simples. Porque o conteúdo é interessante e a comunicação à volta destes produtos desperta o interesse dos consumidores.

Nesta matéria, qual é o ponto da situação do basquetebol português?

António Pereira


Sunday, March 10, 2019

Vítor Campos – um rosto da marca Académica de outros tempos

A morte de Vítor Campos, um dos jogadores mais carismáticos e um dos maiores símbolos, hoje poderíamos dizer da marca, da Associação Académica de Coimbra (AAC ou simplesmente Académica) dos anos 60 e 70, fez tirar do baú um conjunto de reportagens televisivas transmitidas em diversos canais de televisão, bem como de memórias pessoais, dos tempos em que íamos ao velho estádio do Calhabé ver uma série de mestres no trocar a bola entre eles, numa identidade futebolística de modelo de jogo e de coesão que os diversos membros da equipa colocavam em campo, o que levava muitas vezes, quer a bancada dos estudantes, quer a bancada dos doutores a gritar «Olé! Olé! Olé! tal era a incapacidade de os adversários se oporem ou conterem este estilo de futebol. 

Quem não se lembra de histórias que se contavam e que muitos viram de que era necessário mandar a bola para fora para que a equipa adversária pudesse voltar a tocar bola? Lembram-se?

Na altura, a Académica era um clube sui generis, porque diferente em Portugal.

Quem vinha jogar para a Académica procurava uma formação académica e obtinha determinados privilégios por ser bom jogador de futebol ou ter potencial para o vir a ser.


Vítor Campos é um dos nomes de uma extensa lista de estudantes/atletas que se formaram naquela altura e que, quer no seu percurso profissional, quer mesmo no futebol, deram contributos importantes para a sociedade portuguesa.

No inicio dos anos 70, quando comecei a frequentar o ensino secundário de então e a jogar basquetebol, era normal vermos os jogadores de futebol da Académica na zona da Praça da Republica ou no Gil Vicente, sinal de envolvimento na comunidade estudantil e da cidade, bem como a ver jogos de outras modalidades da Académica, nomeadamente o basquetebol.

Contudo, o espirito da Académica dos anos 60, 70 e até 80 deixou de existir, por via da evolução da sociedade e do desporto em particular.

Hoje, um jovem atleta de futebol procura acima de tudo ser treinado por bons treinadores que o potencializem e um clube/equipa que lhe permita desenvolver e mostrar talento. Se tiver talento, pode construir uma carreira de sucesso e ganhar dinheiro ou muito dinheiro, tudo depende do nível de competição e de equipa que consiga atingir.

Num contexto social e desportivo diferente, onde as organizações desportivas estão inseridas numa indústria desportiva e de espetáculo, que Académica podemos ter no futuro?

Mas podemos e devemos ir mais além e perguntar o que é realmente a Associação Académica de Coimbra – Organismo Autónomo de Futebol e a sua SDUQ? Quais são as características da sua marca? Como se pode diferenciar dos outros clubes? Qual a consistência da sua mensagem? Qual a sua real ligação à comunidade estudantil? A cidade revê-se neste clube e equipa? Que potencial económico tem? Consegue sobreviver ou atingir um patamar de excelência ou de ótimo com um SDUQ ou terá de se constituir uma SAD onde a Académica detenha a maioria do capital?


Num momento triste para a história do futebol da Académica, para a família Campos, para o núcleo de veteranos de futebol da Académica uma boa homenagem que se poderia fazer ao grande Vítor Campos era que a Académica-OAF do século XXI fosse algo com que nos identificássemos e que voltasse a ser uma marca de referência na indústria desportiva.

Vítor Campos, obrigado pelas memórias que me deste e que permaneças em paz.

António Pereira
Ex-atleta de basquetebol da AAC e CAC

Ex-treinador da AAC